19/08/2025

STF autoriza retirada de sigilo de delações da Odebrecht sobre crimes no exterior

Por: José Higídio
Fonte: Consultor Jurídico
O Plenário do Supremo Tribunal Federal confirmou a possibilidade de retirada
do sigilo dos acordos e depoimentos de delações premiadas de ex-executivos
da empreiteira Odebrecht (hoje chamada de Novonor) sobre crimes cometidos
em outros países, nos casos em que já houve acordo com as autoridades
estrangeiras ou que o diálogo tenha se encerrado. O julgamento virtual
terminou nesta segunda-feira (18/8).
Odebrecht alegou que retirada dos sigilos poderia prejudicar negociações em
curso
O colegiado manteve decisão de 2023 do ministro Luiz Edson Fachin, que
estabeleceu os critérios para isso. Assim, a Procuradoria-Geral da República
pode solicitar que os acordos se tornem públicos, e o colaborador tem a
oportunidade de justificar a restrição de acesso a documentos e informações
processuais sensíveis.
Contexto
Os acordos foram assinados em 2016 com o Ministério Público Federal. O
sigilo inicialmente seria de seis meses, mas foi prorrogado no ano seguinte por
tempo indeterminado, para garantir um “ambiente propício” às negociações
com autoridades estrangeiras.
Em 2023, Fachin estabeleceu critérios para a retirada de sigilo. Segundo a
decisão, nos casos em que já houve acordo com autoridades estrangeiras ou que
o diálogo tenha se encerrado, não há mais motivo para se manter o sigilo.
A princípio, as negociações da Odebrecht com Estados Unidos, Suíça,
Equador, Peru, Guatemala, República Dominicana, Panamá e Moçambique se
enquadraram nas situações descritas pelo magistrado.
A construtora recorreu da decisão e apontou que ainda negocia com Argentina,
Colômbia, Venezuela, México e Angola. Assim, argumentou que as negociações
poderiam ser prejudicadas caso os sigilos caíssem.
De acordo com a empreiteira, a retirada dos sigilos significaria tratamento
desigual entre países estrangeiros. Além disso, o fim das negociações com um
país estrangeiro não seria suficiente para permitir o levantamento do sigilo, pois
seu acordo de leniência na “lava jato” prevê o estímulo a tratativas com outras
jurisdições para promover a expansão de investigações de corrupção.
Voto do relator
Fachin, relator do caso, seguiu com seu posicionamento apresentado em 2023
e votou por manter aquela decisão. Ele foi acompanhado por Luiz Fux, André
Mendonça, Luís Roberto Barroso, Alexandre de Moraes e Flávio Dino.
O relator explicou que o sigilo de atos processuais deve ser mantido somente
“por período estritamente necessário” à preservação dos interesses.
Ele lembrou que o acordo de leniência da Odebrecht com o MPF, citado no
recurso, não prevê seu sigilo absoluto.
Segundo o magistrado, os parâmetros estabelecidos em 2023 “de modo algum
possibilitam prejuízo às negociações ainda em curso com países nos quais as
informações repercutem”.
O ministro lembrou que a decisão permite a “excepcional manutenção do
sigilo” depois de uma “análise individualizada de cada caso”.
Fachin indicou a “impossibilidade jurídica de eternizar a prorrogação do sigilo
sobre os fatos delituosos praticados em território estrangeiro”. Ele ainda
ressaltou que já se passou um tempo “significativo” desde a homologação dos
acordos.
Divergência
O ministro Gilmar Mendes divergiu do relator e votou por manter sob sigilo os
depoimentos prestados nos acordos de delação enquanto ainda houver
negociações com outros países. Ele também reiterou que a Odebrecht deve
apresentar relatórios trimestrais para detalhar o estágio das tratativas.
O voto foi acompanhado por Dias Toffoli e Kassio Nunes Marques, mas essa
corrente ficou vencida.
Para Gilmar, “não houve modificação relevante na situação fático-jurídica” que
vinha garantindo o sigilo das declarações dos colaboradores.
Embora as negociações com alguns países tenham terminado, o ministro
ressaltou que a construtora segue em tratativas com diversos outros, conforme
a atualização mais recente apresentada. Isso foi destacado pela própria PGR ao
pedir o levantamento parcial de sigilo.
Mesmo nos casos em que já houve acordo, o magistrado constatou que
“persistiam, em alguns países, expedientes judiciais que visam a desconstituição
dos referidos instrumentos de colaboração”.
Ele ainda apontou que o acordo de leniência da empreiteira prevê “uma série
de obrigações a serem observadas pelo MPF quanto à preservação do conteúdo
das provas produzidas”, mesmo depois do fim do prazo de sigilo.
Assim, Gilmar considerou inviável no momento tornar públicas as provas
produzidas no acordo de leniência e nas colaborações premiadas dos exexecutivos,
pois isso poderia prejudicar negociações em andamento com
autoridades estrangeiras.
“O imputado colaborador aceita produzir provas contra si mesmo tendo em
vista os termos acordados no pacto negocial com o Estado”, explicou. “A
utilização de tais elementos probatórios, produzidos pelo próprio colaborador,
em seu prejuízo, de modo distinto do firmado com a acusação e homologado
pelo Judiciário, é prática abusiva, que viola o direito a não autoincriminação.”
O ministro Cristiano Zanin se declarou impedido.
Pet 6.977